(A cena acontece no salão do cassino. Tem uma mesa de cartas ao centro. Aércio coloca mais uísque em seu copo. Está à mesa. Guilherme tá sentado em um banco, diante de uma menina caída no chão. Ela está morta. PC anda de um lado para o outro. Tá desesperado. Visivelmente alcoolizado. A cena toda é punk. Música punk).Guilherme –
(grita) Desliga essa merda!
Aércio – Fala baixo, porra!
Guilherme – Baixo é o cacete! Como é que vocês querem que eu me concentre com esse espôrro?
PC – Fudeu, cara! Fudeu! Se eu desligar vai todo mundo ouvir a nossa respiração. E agora, mano? Eu disse que ia dar merda. Eu falei que ia babar. Mas não, eu tô sempre errado...
Guilherme – Vai se fuder, cara! Isso aqui é culpa tua. Tamo assim por sua culpa!
PC – Tá vendo? Eu sabia que esse babaca ia me botar no fogo. Sedutor de menores...
(parte pra cima de Guilherme. É apartado por Aércio) Vou te quebrar todo, seu escroto! Me larga, Aércio! Me larga que eu vou matar esse puto!
Guilherme – Vem, seu viado. Tu é um tremendo de um cagão. Reclamou tanto que não ia dar certo. É lógico que tinha que acontecer alguma merda. A vadia tá morta! E a culpa é tua.
Aércio – Pega leve, Guilherme. O barco é o mesmo pros três. E vocês também são foda! Tem um presunto aqui na sala. Sacaram?
(
os três olham para a menina. Pausa. A música pára).
PC – Eu falei do viadinho do Fidélis, foi aquele filho da puta do sargento Fidélis. Ele caguetou nós. Meu, eu disse que com os alemão o tratamento era diferenciado. Quem tá dentro de puteiro quer mais é fuder!
Aércio – Legal, PC, mas agora a gente é que tá bem fudido. Vamos manter a cabeça no lugar. (
Dá a garrafa pra ele) Entorna, vai. Segura um pouco a onda. Tua cara tá caguetando legal.
Guilherme – Você viu a cara dela? Apanhou pra caralho. Se eu pego esse filho da puta, eu arranco as bolas dele. Pode crer. Faço ele mastigar as suas próprias bolas. (
pausa) Vi isso num filme. O cara tava de cara com o estuprador de sua filha. Pegou um cabo de vassoura e enfiou no rabo dele. Depois deu um bico no cabo, sabe, pra enterrar melhor (
gargalha). Judiou mesmo. É isso. Se eu encontro esse cara, eu judio mesmo!
Aércio – Acho que tu também precisa de um gole. Passa pra ele, PC. O cara tá em choque. (
PC passa a garrafa. Pausa. Os três não tiram os olhos da menina).
PC – Aí, gostei do teu discurso, mas não me comoveu. Cara, você fala como se fosse diferente do viado que fez isso com a Pink. Se liga irmão, tu colocou a vadia aqui. Foi tu que prometeu um monte de abobrinha pra essa criança. Se ela tá aqui no chão, a culpa é tua. Eu não, eu sempre disse que essa porra ia melar. Mas eu sou o desequilibrado, não é? Sou o cara que cria confusão com todo mundo. Agora, foda-se! Vamos chamar logo a polícia e botar pra dentro. Que se foda! Vamos assumir logo!
Aércio – Tu ficou louco? Ela deve ter uns 16! Vai passar o resto da tua vida na cadeia. E quer saber? Com essa cara e com esse crime, vai dar o cú todos os dias. Vão fazer fila.
Guilherme – Deixa ele, Aércio, faz o seguinte, PC, deixa a gente sair e depois liga pros alemão. Coloca nós fora dessa. Aí, Aércio, vamos rapa a grana do banco. O cofre tá abarrotado também. Esse malandro não vai precisar de dinheiro mesmo. Dá pra gente ficar fora pelo menos uns dez anos, até a poeira abaixar. O que acha? Vamos pro interior. Essas minas daqui, a maioria são de lá. Ao invés delas virem pra cidade grande, vamos montar uma conexão por lá. Ninguém vai nos achar. Depois agente monta outro cassino e dessa vez, sem putinha de menor. Conexão Amazônica diversões e entretenimentos ltda. Legião Urbana, lembra, o que acha?
Aércio – (
pensativo) É uma.
PC – É uma é o caralho! Vocês não vão me deixar nessa roubada não! Eu também tô nessa. E essa grana também é minha, se esqueceram?
Aércio – (
tira uma pistola debaixo da roupa e a põe na mesa) Então é o seguinte, deixa de viadagem e cala a boca! Agora, o que a gente precisa mesmo é resolver essa parada. Bom, fugir eu não acho que seja uma boa. Cara, o cassino tá du caralho. E tamo cheio de puta. O lance é colocar as de menor pra correr e abafar o caso. Isso aqui é uma mina de ouro.
Guilherme – Mas de que jeito? Teve testemunha.
PC – Testemunhas?
Guilherme – Isso mesmo, algumas pessoas viram a menina e além do mais, a gente não devia ter tirado o corpo lá do quarto. O povo viu a gente carregando o cadáver. Cara, se eu vejo uma cena dessas, tu acha que eu vou pensar o quê?
PC – A gente pode dizer que a vadia tava bebaça. Isso é normal por aqui.
Aércio – Tá legal. Mas a Betânia viu que ela tava morta. E ainda saiu comentando pelo salão.
Guilherme – Por isso que o povo começou a vazar.
Aércio – A safada bateu com a língua nos dentes.
PC – Vamos matar a Betânia?!
(
pausa)
PC – (
grita) Vão se fuder! O que vocês querem? Que um santo baixe aqui na terra e carregue o corpo dessa infeliz? A piranha tá morta! Morta! O negócio é o seguinte, vamos cortar o corpo da vadia, ela é baixinha, são poucos pedaços e depois jogamos tudo dentro do rio pra alimentar os peixes.
Guilherme – Só porque ela é pequena você acha que são poucos pedaços? Seu escroto, ela tem os mesmos pedaços de uma mulher mais velha, adulta.
PC – Mas olha o tamanho do braço dela (
segura o cadáver), você acha que a Junkie, que é o maior poste, o maior vara pau, tem os mesmos pedaços que ela? Vai se fuder! Vamos fazer o seguinte, a gente esquarteja a Junkie e a Pink. Separamos duas malas iguais e aí é só casar a grana. Quero só ver se não vai sobrar pedaços da Junkie pra guardar na mala. Tu é um merda mesmo!
Aércio – Merda são vocês dois! (
aponta pra menor morta) Olha o problema aí. E vocês discutindo de que jeito vão colocar os pedaços das vadias dentro de uma mala... Caralho! Apostar? E a Junkie, o que tem a ver com isso? Ela não tava nem aqui.
PC – Foda-se! Acabou de entrar na história. Quero resolver a parada com esse mané. Pera lá, tudo que eu digo ele desdiz?
Guilherme – Isso mesmo, agora a viciada vai morrer. Vou enfiar ela todinha dentro da mala, tu vai ver...
Aércio – Então porque não colocamos a Betânia? Ela é grandona também. E foi ela que deu todo o serviço.
(
pausa).
PC – Beleza. Eu topo. A Betânia serve.
Guilherme – É mesmo. Vamos retalhar essa piranha. Ninguém tá comendo ela mesmo. Isso aqui não é negócio pra ficar dando prejuízo. Não tem essa de -
não ganhei hoje. A casa sempre ganha, esse é o nosso lema.
Aércio – Tá legal. Agora vamos nos livrar desse corpo. Trás a mala PC. Depois a gente dá um fim na Betânia. Guilherme, pega o terçado. Eu vou estender um plástico no chão. Não pode ficar nenhum vestígio dessa vadia por aqui. Nós nunca a vimos. Entenderam? E a partir de hoje não entra mais de menor nessa casa. Certo?
(
Cada um vai para um lado. Black-out. Pausa. A campainha toca. Guilherme vai atender. É uma menina linda. Tem uma mochila nas costas).
Estrela – Oi.
Guilherme – (
dá uma comida com o olhar) Oi. Quer falar com quem?
Estrela – É que me falaram que aqui... que aqui vocês recebem algumas meninas pra dar um tempo...
Guilherme – Sei.
Estrela – Olha, eu cheguei ontem do interior e...não dormi nadinha ainda...tô precisando de um banho. Qual é o esquema? Deixa eu ficar, vai? É só por uns tempos, só até eu entrar pra faculdade.
Guilherme – Qual tua idade, princesa?
Estrela – 17.
(
Guilherme acena com a cabeça. Ela entra. Ele sai, tira um terçado da cintura e dá uma olhada na rua. Apenas uma conferida. Volta pra casa. Black out.).