domingo, 16 de maio de 2010

A MATADORA DA LIXEIRA DO 3º ANDAR

Paty Fat era uma menina que não chamava muito a atenção dos garotos do bairro. Pelo menos, não na primeira encarada. Não tinha as mesmas medidas das beldades das capas de revistas de modas e nem se importava muito com as vaidades femininas, diferente das outras meninas. Mas era uma gordinha engraçada. E só por isso, já havia traçado praticamente todo o bairro. Ela não costumava alimentar paixões platônicas, nada disso, não perdia seu tempo com isso. Sabia que não tinha muitas chances e esperava atenta pela grande chance. Quando marcavam perto dela, já era. Os homens do Cabeça e os outros das redondezas sempre gostaram de mulheres bem humoradas. Na primeira olhada, é lógico que a forma física reinava, e veja bem, essa tática não era muito perfeita, pois já fez muito machão deitar-se com belos machos que vendiam o seus corpos pelas ruas da Lapa. Mas depois de cinco minutos de conversa, para Paty Fat, eram o suficiente para enfiar-se de todos os jeitos boca adentro de suas vítimas. Uma verdadeira matadora. Mesmo sem a aprovação das amigas frustradas e a não propaganda dos machos rendidos, ela era o máximo. Título que não lhe permitia carregar muitas amigas de sobra. Nem todas conseguiam aceitar esse tipo de derrota, afinal, uma gordinha fora da moda, alta, peituda e ainda por cima fã fervorosa do Led Zeppelin, isso não era para qualquer uma. As outras sabiam que não podiam competir com ela. Ou pelo menos não com a tal banda de rock. Piranha, pegador veterano e maluco de carteirinha, um dia resolveu que faltava deixar sua pegada naquela menina. Afinal de contas, a meia boca, todo mundo dizia que tinha comido a pobre gordinha excluída, até quem nunca pegou afirmava de pé junto já ter passado por ali. Ele não queria tirar vantagens sem ter experimentado a criatura. Por mais mau caráter que fosse, honrava todas as suas conquistas. Não era um cara de meias palavras e nem perdia o seu tempo contando lorotas em uma das esquinas do núcleo da bomba. Na noite do dia dos mortos de 84, a turma toda se reuniu na portaria do Cabeça. Era feriado. Mais de 30 jovens, de várias idades, conversavam sem parar. Uns faziam o frete até o Bar do Bigode, um antro enlouquecido que deixava pendurar contas de bebedeiras, e traziam várias doses de uma batida de mel calorosa dentro de copos de plástico, outros, na distração de todo mundo, roubavam toca-fitas de carros que estavam distante dali. Era a turma mais velha e de nariz invocado. Alguns, em um canto mais malocado, jogavam sueca e apostavam beijos na boca. Quem perdesse, não tinha perdão, o beijo acontecia diante dos olhares cheios de tesão da moçada. Machos convictos beijavam outros machos e belas gatas enfiavam a língua por dentro da boca de outras mais lindas ainda. E tinham público. Paty Fat não se interessava pelo jogo. Dizia que seu fogo só apagava com pauladas bem dadas. Não queria correr o risco de beijar outra dama. E com isso, a maioria ficava entretida nas cartas e sempre sobravam umas vítimas de lado. Piranha foi uma dessas, quero dizer, antes de morrer, mais de 20 anos depois, ele jurou que armou toda a parada naquela noite. Mas vamos aos fatos. Paty Fat tinha as suas armas. E uma delas era sempre ter escondido na lixeira do 3º andar um maço de cigarros bem cheios. Piranha fumava demais e nem sempre tinha dinheiro para comprar seus cigarros. Filava de todo mundo e todo mundo vivia escondendo seus cigarros dele. A matadora resolveu pegar sua presa pelo pulmão, estava decidida a dar uns amassos no veterano pegador do bairro. Aproximou-se sem muitas insinuações, como de costume, sem dar bandeira e falou bem perto dele, - tô louca pra dar um trago, mas aqui tem muita gente... Piranha caiu na primeira tentativa, - se eu arrumar um cigarro, não sei, mas a gente pode ir lá pra a esquina, o que acha? Nessa hora e sempre nessas horas é que ela nunca bobeava e até hoje dizem que faturava tantas bocas devido a sua presença de espírito. Espírito louco para beijar, – eu tenho um maço cheinho lá no 3º, vamos? Era a cartada final. A espetada fatal no touro cansado. Subiram na encolha, sem serem vistos. O Cabeça não tinha elevador e assim ela subiu as escadas na frente, mandando suas carnes de um lado ao outro, fisgando em cheio o pobre fumante. Não falaram nada durante o percurso. Naquela idade, não precisavam de muitas palavras, já estava na cara o que iria acontecer em seguida. Ou quase tudo. Invadiram a lixeira do 3º andar. Um cubículo fedido, com a luz queimada, cheio de restos de lixo espalhados pelo chão. Tinha um buraco aberto na parede para os moradores jogarem seus lixos, que iriam cair direto no incinerador. Tarefa que poucos faziam. O local fedia tanto, que até as baratas o evitavam, somente as mais largadas marcavam presença no local. Paty Fat encostou a porta às pressas. Entrava apenas um facho de luz. O suficiente para iluminar a sacanagem que estava prestes a começar. Piranha arregalou os olhos, mesmo sendo maluco de carteirinha não dava para não sentir o horrível cheiro daquele minúsculo ambiente. Mas ela não ligava para esses detalhes. Tinha uma meta a cumprir. Ele não teve nem a chance de perguntar pelo maço. Ela pulou em seu pescoço e mergulhou sua boca dentro da dele. As mãos dançaram frenéticas pelos dois corpos. Chupões, mordidas e lambidas dentro da orelha sobraram. Ele estava acostumado a comandar, mas com a matadora isso não era possível. Ela abaixou a bermuda dele, que ficou extremamente sem graça e na hora que ela meteu a mão dentro de sua cueca, o falecido amigo amarelou. Queria conversar um pouco, fumar um cigarro, na tentativa de reverter a situação, se os amigos soubesse do ocorrido ele na certa ficaria muito mau na fita. Ela não perdoou. Mandou um soco certeiro no nariz do rapaz, que fez escorrer um melado vermelho. Ele ficou sem entender o que estava acontecendo, muito tonto da pancada e ela, sem vacilar, fez a sua parte tão desejada. Depois, na maior pose superior, acendeu um cigarro, deixou o veterano de guerra sentado no chão da lixeira e saiu. Desceu a escada sozinha, ainda lambendo os beiços. O morador do apartamento 313 abriu sua porta para colocar o lixo para fora. Chegou bem perto da lixeira e apenas empurrou o saco de lixo aberto, lotado de papel higiênico cagado. Nem se preocupou em abrir toda a porta. Piranha ficou na maior merda. Se sentiu tão usado quanto os papéis cagados jogados para dentro da lixeira.




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