segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

O DIA SEGUINTE

não aguento mais ouvir o grito
da minha alma insana
implorando por teu corpo
apelando pro perdão

não aguento o teu silêncio
a tua ausência na minha cama
um belo quadro expressionista
o pôr-do-sol, a escuridão

afeto violento
amor ardente exigente
entusiasmo adolescente
em alto grau e sem razão

doença que ninguém deseja a cura
sofrimento prolongado
o Cristo do alto de uma cruz

de bar em bar eu ando esquecendo o teu nome
vagando como um cão vagabundo sem dono





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sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

AMORÍFERO

Amordaçado, amorativo
Amor que dói é o que existe
Amortiçado? Amortecido
Amor se dói, é que resiste
Amor eu sinto infinito
Amor sem fim e sem princípios
Amor aos berros como um bicho
Que não desgruda é como um vício
Amor passageiro é desespero
Amor inquieto eu ouço gritos, eu ouço gritos, eu ouço gritos
Amor, o que dói é que eu sinto
Sem risco de ser ridículo
Amor, o que dói, é o que eu sinto
Bem simples e sem sentido
Amordaçado, amortecido
Amortiçado, amorativo
Amor de jovem, amor bandido
Que não tem dono e nem juízo
Amor se morre não é desperdício
É perda de tempo desde o início
Amor se vive por inteiro
Se for desespero é passageiro
Amor, o que dói é que eu sinto
Sem risco de ser ridículo
Amor, o que dói, é o que eu sinto
Bem simples e sem sentido




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quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

COMO CÓLERA QUE ARDE

ME SINTO COMPULSIVO
UM TANTO QUANTO OBSESSIVO
ME BEIJA E VAI EMBORA?
EU FICO PERDIDO NOS SES
NEM SEI MAIS O QUE EU SINTO
AS IDEIAS ME FOGEM AGORA
NÃO VEJO MAIS SENTIDO
EM FICAR ESPERANDO NO FIM

NÃO VEJO MAIS SENTIDO
EM FICAR TE ESPERANDO NO FIM
EU FICO AGONIADO
VOU SEGUINDO AFLITO TEUS PASSOS
SE ME OLHA, EU DISFARÇO
TEU ENGANO ME ARRANCA PEDAÇOS
COMO CÓLERA QUE ARDE
COMO UM GRITO MALDITO ENGASGADO
NÃO SEI MAIS O QUE EU FAÇO
SE BEM PERTO É TÃO LONGE PRA MIM

NÃO VEJO MAIS SENTIDO
EM FICAR ESPERANDO NO FIM
JÁ TÔ QUASE ABORTANDO
EU NÃO TENHO MAIS UM PLANO
EU NÃO VEJO MAIS SENTIDO
EM FICAR TE ESPERANDO NO FIM

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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O MENINO QUE MORREU SUFOCADO COM AS PALAVRAS

Não tinha jeito de convencer o menino a jantar no horário. Leon comia de tudo durante o dia e sempre da maneira mais descontrolada possível. Já levantava da cama, pela manhã, mastigando o vento. Se escovasse os dentes sem a supervisão de um adulto, comia todo o tubo da pasta. E se alguém reclamasse com ele, saía enfurecido resmungando pela casa com a boca toda esverdeada. Os pais cortavam um dobrado com o apetite insaciável do pivete. Ele não era igual aos outros moleques da rua. Queria tudo ao inverso, o ritmo oposto, a leitura do livro pelo final. Só existia uma coisa capaz de satisfazer - ou melhor, de disfarçar - o apetite voraz do garoto. As palavras lhe causavam um encantamento quase que paralisante. Diante delas, ele pendurava o tempo no varal. Quando passeava pelas ruas do bairro, devorava os anúncios das vitrines e dos outdoors, fazia questão de guardar todos os folhetinhos de propagandas que eram distribuídos aos montes no comércio que ficava no final de sua rua. E tudo que lia ele repetia em voz alta. Absorvia ao máximo os novos significados que a vida lhe apresentava. Isso tudo seria considerado normal, se não fosse o verdadeiro fascínio inexplicável que o menino tinha em ler as palavras pelo lado contrário. Acreditava que o verdadeiro significado estava lá, da direita para a esquerda – e falo aqui de um pirralho de apenas 10 anos, que criou uma língua paralela. Quando pensamos que atingimos o limite, a vida nos surpreende com a possibilidade da dor de cabeça ser bem maior do que imaginávamos – um comportamento esquisito que deixava os pais de Leon intrigados, uma língua que só ele entendia. Certo dia, em um desses inofensivos passeios pelas ruas do bairro com a sua família, o garoto conseguiu ler um anúncio do lançamento da nova sensação dos chicletes WORDS – vocês podem até imaginar que o Leon sendo um tremendo fominha, deve ter perturbado os pais para adquirir alguns - mas esses chicletes não eram como os outros que traziam, em sua maioria, figurinhas para serem colecionadas. Esses traziam palavras coloridas. A cada chiclete comprado o indivíduo recebia uma palavra e assim ele ia formando frases e mais frases. O moleque só parou de repetir a palavra SDROW quando conseguiu que seus pais comprassem 10 caixas para ele – eram 200 chicletes por caixa – ele ficou extasiado e fez questão de carregar várias, sozinho. Queria de qualquer maneira saber todas as palavras do mundo. Entrou em casa como um trem desgovernado, derrubando tudo que via pela frente. Foi direto para o seu quarto, trancou-se, empurrou o armário para a porta, fechou as janelas e arrastou as cortinas. Enfiou-se debaixo da cama. Mantinha uma caixa de chicletes agarrada ao seu peito e algumas outras espalhadas pelo chão. Rasgou o plástico e enfiou a mão com vontade - não havia nenhum adulto por perto e aquela leve sensação de liberdade o fez mastigar um número exagerado de chicletes ao mesmo tempo -. Estava extremamente feliz. Mastigava e juntava palavras. Depois de colocar um monte de chicletes em sua boca e sem conseguir parar de rir de tanta satisfação e gozo, o menino percebeu o bolo da gosma doce que escorregava para a entrada da sua goela. Tentou reverter o processo, mas já era tarde. Um pedaço imenso de chiclete alojou-se em sua garganta. O menino tentou sorrir um sorriso desesperado. Tentou tossir uma tosse forçada. Tentou falar, mas já não tinha forças para articular. O ar já não passava. Debateu-se roxo, contorceu-se ao limite e sufocou em um susto. Nenhuma palavra bastava.


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terça-feira, 3 de janeiro de 2012

HOMENAGEM AO SURFISTA CALHORDA

Estacionou seu pequeno fusquinha amassado num mísero espaço entre duas caminhonetes. Foi preciso no cálculo. Nem de longe chegou perto das inúteis orientações paranóicas de seu antigo instrutor. Saiu pelo teto solar, com os braços abertos, espreguiçando na cara do sol, na maior cara-de-pau. Olhou para o mar, esperançoso, e avistou altas ondas. Poucos surfistas se aventuravam no quintal de Poseidon. Apenas alguns Big Riders tarados e sem um pingo de responsabilidade na lata. A areia bombava de gente por todos os lados. O cheiro do medo antecipava qualquer comentário - era a maldita ressaca de Janeiro! De tempos em tempos, pranchas aos pedaços voavam e minúsculos corpos desmaiados e destroçados eram arremessados de volta à areia. O mar não fazia acordos e muito menos estabelecia diálogos. Marcão Marconha, cheio de si, sacou sua prancha de madeira, rachada, fez um sinal da cruz, deu um último tapa e invadiu as areias da praia. E a cada passo que dava, em meio a fumaça que revelava o herói, o povo comentava.


- olha lá, é o Madeira!


- é mesmo, irmão, acho que o minhoca do Madeira vai cair!


- ele disse que era a sua despedida! Vai enterrar a madeira rachada!

E assim as bocas falavam. Bocas de curiosos, bocas de espírito de porco e até mesmo bocas avermelhadas e carnudas, loucas para dar um pega legal no carinha da hora. Marcão chegou bem na beira da água, repousou a prancha - que pra muitos já era da idade da pedra - e sentou-se confortavelmente. Alongou-se, como qualquer atleta safo. O mar estava gigante - qualquer imagem perto do fim do mundo era pinto – e ele olhou para trás, cabreiro e viu a moçada, geral, com os olhos arregalados e os lábios mordidos. Não tinha mais volta. Ou ele domava os vagalhões impossíveis, ou então, passaria o resto de seus dias com os dedos dos outros enfurnados em sua cara. Molhou os pés – cautelosamente – e sentiu uma leve tapa da brisa que vinha do mar. Arrepiou até o último fio do cabelo. Nenhum surfista havia conseguido entrar, pegar uma onda inteira e voltar para praia – como disse antes, eles eram arremessados como cuspe desengonçado que vara sem destino pelo ar – ninguém conseguia finalizar uma onda. O mar decididamente não estava para peixes – o que dirá pra surfistas calhordas – mas o Marcão era o cara. Ele tinha o gérmen da insanidade correndo enlouquecidamente pelas suas veias. Para ele não tinha tempo ruim. O povo na areia não parava de comentar.

- ele não vai conseguir...


- tá fudido! Chama logo a emergência!

Ele percebeu o burburinho. Estava mais do que decidido. Enfiou o estrepe no pé direito, caminhou em direção à água e caiu de cara no mar nervoso. Por alguns instantes, desapareceu. Ninguém entendeu nada. Era só espuma e pancadas violentas na arrebentação. O silêncio imperou – eu vi gente chorando, pode acreditar, eu tava lá – e sem que ninguém percebesse, depois da última série avassaladora, o Marconha despencou de 90 pés enfurecidos – são 30 metros maluco! – e veio cheio de marra, berrando a música do Michel Teló, com os braços abertos como no Titanic, cortando todas as possibilidades de erros, entubando radicalmente, chegando bem na beirinha e saltando da prancha como se fosse brincadeira de criança. Na areia o povo urrava de felicidade, mas sua saída do mar foi em silêncio, estufada de moral. Ele cavou um buraco, enterrou sua prancha, fez uma rápida oração – despedida - e caminhou para o estacionamento. Entrou no fusquinha pelo teto solar e depois de muito amassar as caminhonetes, saiu cantando o pneu. Bateu de frente no cruzamento da Mavericks com a Jaws, em um imenso caminhão de cerveja. Perda total do veículo. Marcão Marconha morreu.

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