segunda-feira, 29 de agosto de 2011

É TUDO TÃO CONTRADITÓRIO, NÃO ACHA?

JOICE LEÓ


FOTO: ORIB ZIEDSON





A temporada do espetáculo APENAS UM BLUES E UMA PAREDE PICHADA tem me surpreendido bastante. Esse é o terceiro projeto teatral de palco que a Cia. do Lavrado apresenta em seus seis anos de existência. Fizemos nossa estreia com O Pastelão e a Torta, em 2005 e Homens, Santos e Desertores, em 2008.
Ano passado, fomos convidados pelo Grupo Malandro é o Gato para a produção de Se Meu Ponto G Falasse, no qual fiz a Direção e a Trilha Sonora, a Graziela Camilo e o Renato Barbosa, ambos da Cia. do Lavrado, trabalharam como Atriz e Desenho de Luz, respectivamente.
Esse ano, decidimos encarar um drama. Colocamos em cena conflitos atuais quer dizer, ainda atuais, e percebemos de cara a resistência da sociedade em discutir certos conflitos.
Bom, o fio condutor dramático do espetáculo é o suicídio entre jovens. É a partir deste assunto que abordamos outras questões e que na verdade, são as que mais aparecem no nosso trabalho, como: gravidez não planejada, dificuldade na relação familiar, bullying, uso abusivo de álcool, cigarro e outras drogas, sexualidade e os rótulos sociais, enfim, é uma peça realista.
Percebemos até agora, que o público de Boa Vista não tá muito interessado em discutir essas questões e essa avaliação não é negativa, muito pelo contrário. É uma resposta imediata e significativa para o que estamos nos propondo. Embora o sucesso nos pareça sempre maior quando a casa está lotada. O que não é fato. Nem tudo que enche é de boa qualidade e nem tudo que tá vazio é uma merda. Digo isso pelo exemplo do teatro, dos shows de música regional, dos espetáculos de dança (que praticamente não existem no estado, a não ser em encerramento de curso), das exposições, dos cinemas gratuitos, enfim, podemos discutir muito mais sobre isso.
Em 2008, quando colocamos em cartaz o espetáculo Homens, Santos e Desertores tivemos uma média baixíssima de público. Era outro espetáculo realista, com conflitos existenciais e urbanos. Quem compareceu, curtiu e muito, até mesmo porque o texto de Mário Bortolotto é porrada na cara. É lindo.
Como sempre fazemos e assim acreditamos ser o nosso papel, colocamos novamente um drama em cartaz, mexemos na ferida de muita gente, na verdade de todos nós, pois todos temos feridas expostas. Tratamos daquilo que as pessoas evitam discutir dentro de sua própria casa. E é dessa forma que as relações interpessoais se desgastam. A falta do diálogo.


Cobramos um ingresso que acreditamos ser justo, R$ 14,00 e R$ 7,00, pois se nós não nos valorizarmos, então... mas aqui em Boa Vista o assistencialismo ainda impera, é cultural e vai demorar para modificarmos esse quadro. As pessoas ainda querem consumir arte só se for de graça ou bem baratinho. Bom, muitos artistas ainda seguem esse padrão, não contribuem em nada para que tal mudança aconteça. Não acreditam no que fazem. Pedem ajuda ao invés de firmarem parcerias. Acreditamos em uma temporada com 12 apresentações, que nos desse a oportunidade de vermos nosso trabalho nascer de verdade, pois a maioria dos espetáculos aqui de Boa Vista nem chegam a nascer. E falo da gente também, pois quando ensaiamos três meses e fazemos apenas 6 apresentações, como foi o caso de ABSURDÓPOLIS, QUE NOS PERDOE ARISTÓFANES, em 2009, que montamos com recursos próprios, sem dúvida alguma que matamos nosso trabalho antes mesmo dele nascer. É o preço que pagamos por depender demais dos editais e quando não conseguimos aprovar nenhum projeto, morremos na praia. No momento, estamos fazendo a nossa parte. Falando daquilo que acreditamos ser necessário. E com dramaturgia própria!
A formação de público em qualquer lugar do país é algo extremamente complexo. As pessoas não tem o hábito de consumir arte como algo necessário para a sua existência, a maior parte da população pensa apenas no entretenimento. Quem faz parte da Cia. do Lavrado ou já fez já conhece o nosso discurso por aqui, quem quer fazer teatro precisa ir ao teatro, aos shows, exposições, a todas as formas possíveis de arte que existem no nosso estado. Precisa ler mais o mundo a sua volta.
Com tudo isso, chegamos na metade da temporada. No último fim de semana foi um outro espetáculo. E na próxima semana será outro. Novos pontos de vistas para discutirmos e assim o teatro segue, cada vez mais vivo e provocativo. E lendo Denise Stoklos na semana passada, continuo com a questão: Pra que um cenário belíssimo, um figurino novíssimo, cheios de coloridos, a conta bancária gorda dos editais, se quando eu faço teatro, veja bem, quando(?) eu faço, o que faço não diz nada? Morro de medo de me tornar um medíocre. E será que não sou um? Como diz a personagem FREE, em Apenas um Blues... - É TUDO TÃO CONTRADITÓRIO, NÃO ACHA?







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