terça-feira, 14 de dezembro de 2010

ELLA



Ella não completou. Eram apenas 15 anos de casada no último domingo. Não era um sonho realizado, mas também não deixava a desejar. Ainda sentia muito tesão pelo marido mais novo. O que pegava de verdade era a rotina que às vezes sufocava. Quando mais nova, foi vocalista de uma banda feminina cover do Pink Floyd, as Pink nickies. Conheceu o marido no backstage de um festival de fim de ano no subúrbio onde morava. Ele levou os instrumentos no último dia do show e nunca mais saiu. São dois filhos. Um moleque extremamente agitado de 3 anos e a menina goela de ouro, de 6 meses. Com a correria do dia-a-dia, os momentos dela se resumiram aos cigarros escondidos dentro do banheiro da churrasqueira no quintal. E os goles na garrafa de vodka malocada na caixa de carvão. Já tinha feito de tudo e quando se internava no seu cantinho era justamente para ficar mais perto do tudo. No último domingo, resolveu cuidar do jardim. Talvez um incentivo para arrumar as gorduras de sobra. Não tinha paciência para academia de ginástica. E bebia. Eram muitas folhas caídas ao chão. Muitas mudas derrubadas pelo vento, não estava com uma cara legal. Abaixou-se para cavar. Suspirou profundo ao revirar a terra molhada, esfregou-a nos braços e puxou bem forte o ar. O gosto da maconha invadiu sua boca, sua garganta e o seu cérebro descansado. O cheiro vinha do outro lado do muro. Abandonou a terra e colocou um balde colado ao seu. E expiou de leve, só uma vista. A vizinha falava ao telefone e gesticulava tanto, bem mais do que golpes de karatê em alta rotação. Só parava de dizer com as mãos quando metia um tremendo baseado na boca. Ella não fumava fazia horrores. Era do tipo que não dava mais para fumar. Fazia merda. Sempre. Com isso, resolveu sossegar. Mas o bagulho estava perto. Bem ao seu lado. Estava na hora de uma mudança radical.
- oi, vizinha!
- oi, você tá aí? Nossa, que indiscrição a minha...
- que nada...posso?
- lógico! O portão tá aberto, dá a volta...
Ela partiu desesperada. Considerou o primeiro pensamento como uma ordem inquestionável. A vizinha não o apagou. Sabia que não tinha muito mais tempo. Apertou o controle remoto do portão por várias vezes. Ficou livre na oitava e fechou de primeira. Esbarrou, sem tempo para as desculpas, em dois funcionários da Prefeitura que saíam da casa da frente.
- bom dia!
- muito bom, mas eu tô com pressa!
- mas é a Campanha da Dengue...
- vai expulsando os mosquitos das outras casas e deixa essa pro final...
Os rapazes não criaram caso. Sabiam que mesmo completando o serviço por todo o estado, o problema não seria resolvido. E assim eles circulavam pelos bairros, azarando as meninas das vizinhanças sem a menor preocupação com a Hora do Brasil.
Ella entrou. A dona da casa não tinha mais do que 28. Um corpo enorme e magro, o cabelo curtíssimo, era professora de educação física. Trabalhava de noite e passava o dia inteiro em casa, de bobeira. O marido era de tempo integral. A esportista inventava tarefas. Recebeu a vizinha aflita na sala.
- calma... tá aqui...olha... isso... pôxa, quanto tempo!
Fumaram a metade final. Ficaram chapadas. Conversaram muito. Ficaram íntimas. Ali. Ella explode em gargalhadas que contagiam a jovem.
- que merda! Vai começar tudo de novo!
- o que foi, mulher! E olha que foi só a metade...
- é que quando eu tô chapada me dá uma vontade louca de ser chupada...
A magrela gostosa tascou um beijo bem grudado na parceira. Em instantes as roupas desapareceram do cenário. As línguas circulavam agitadas sem direção planejada. Foi tudo pura sensação. Abandonaram os maridos e foram embora para o interior. Não levaram celulares e nem puseram caixa de correio no quintal do sítio que compraram. Ella estava completa. Iniciava assim uma nova contagem.










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