segunda-feira, 8 de setembro de 2008

JOÃO TEIMOSO

O mais difícil era acertar o urso do meio. O parque todo já havia tentado. O prêmio não era lá grandes coisas. Uma escova de criança, um algodão doce, uma agenda do ano anterior... não arrancavam sorrisos de alegria dos vencedores, mas a fama, essa sim era a desejada por todos. Caminhou com tranquilidade e com um certo ar de superioridade até a barraquinha. Pediu uma ficha. Única. Estava confiante. Recebeu das mãos do funcionário a espingarda. Na noite de sábado passado havia gasto quase todo o seu salário tentando acertar o maldito urso do meio. Foi para casa desconfiado de que alguma estava errada com aquele boneco. Pensou até em verificar se o desgraçado caía para trás de verdade. Desistiu da idéia, não ficaria bem para ele, desconfiar era coisa de covardes. As pessoas se aproximaram da barraca. O cochicho começou de longe - Olha lá, o cara que gastou todo o salário! De uma hora para outra, lotou. A mulherada pedia-lhe autógrafos. Ele os deu. Se deixou levar pela fama repentina. Tinha a certeza de que limparia seu nome de uma vez por todas. O funcionário o apressou. Ele não gostou da atitude do rapaz. Imaginou que fazia parte de um plano para desmoralizá-lo. Respirou fundo. Mirou. Acertou o coelho orelhudo da ponta. Algumas pessoas o aplaudiram. Não demorou muito para ele ouvir de outros, que o tal sr. Orelha era moleza. Ficou irritado. Nervoso. E sem mirar acertou no olho do macaco cabeludo. Gritou de felicidade. Agarrou uma mocinha do seu lado, que em seguida foi arrancada pelos braços por sua mãe. O povo riu da cena. Ele ficou furioso. - Acerta o urso! O grito veio lá de trás e logo tomou conta do meio da multidão, que em coro e uníssono gritou, - O urso! O urso! Ele olhou para trás. O povo se calou. Olhou para o funcionário, que trazia risadas no canto da boca. Pulou o balcão. Foi em direção do urso. Deu uma porrada na cabeça do boneco, que logo tombou para trás. - Tá vendo, tu que é ruim mesmo! Gritou um baixinho lá no final, na fila da roda gigante. Começou a suar desesperadamente. Tremeu. O funcionário caminhou para trás do bonequinho, que mais parecia um João Teimoso. Ele, desesperado, e sabendo que sua situação estava complicada, não bobeou . Mandou um tiraço no peito do funcionário, que perdeu o equilíbrio quando passava na frente do boneco e caiu para trás derrubando o maldito ursinho. Silêncio. Ele saiu abrindo caminho na multidão. Acendeu um cigarro, cheio de moral. Pegou a mocinha fugida nos braços da mãe e caminhou em direção ao trem fantasma. Nunca mais voltou ao parque.




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