terça-feira, 13 de dezembro de 2011

JESUS SE FUDEU NESSA HISTÓRIA

Jesus casou-se cedo demais. Não percebeu a peça que o destino lhe pregara. Vindo de uma família pobre, sem muitas oportunidades, seguiu os passos do patriarca. Aos 66 já alcançava a incrível marca de 12 rebentos, ficando atrás de seu falecido pai em apenas oito cabeças. Aposentou-se, também, como pedreiro, mas ainda realizava alguns pequenos trabalhos pelo bairro. Temia sentir a terrível sensação de improdutividade nas costas e mesmo quando não tinha serviço, andava pelas ruas, conversava com um e com outro, mantinha a mente ocupada dividindo suas experiências de vida, principalmente com os mais novos. A soma que recebia mensalmente não era lá grandes coisas. Ajuda dos filhos não tinha. Nem mesmo dos cinco que se casaram, desses só recebia um telefonema a cada seis meses. Um dia, desesperado e com as contas gritando penduradas na porta da geladeira, caiu nas mãos de um agiota e nunca mais se viu livre do usurário. Ficou íntimo do urubu, assim o chamavam. Um sujeito sem feições atraentes. Um tremendo filho da puta, que não perdoava o atrasado nem mesmo de sua pobre mãezinha paraplégica e cega. Pegou o péssimo hábito de frequentar uma vez por semana a casa do tal truculento. Levava biscoitinhos nos finais das tardes. O agiota, malandro que era, tinha sempre um café forte na térmica da pia para acompanhar a meiguice do trouxa. A cortesia fazia parte do esquema. Conversavam por horas. O devedor nunca pagava o saldo completo de sua dívida, e assim, acumulavam-se juros. No final das contas, Jesus sempre conseguia o seu trocado emprestado, mas deixava grande parte para abater a dívida e saía com os restos que mal davam para afastar a ideia de um próximo empréstimo. E assim, sem nem respirar, viveu durante muito tempo. Depois de anos nessa cachaça e preocupado com os seus herdeiros miseráveis, caiu na lábia de um vendedor de seguros. Uma apólice que prometia uma grana altíssima, caso ele falecesse de morte natural. Era a chance de resolver a vida de sua família. Morreria honrado, sabendo que deixaria a mulher e os filhos com o boi na sombra. Finalmente sentiu uma ponta de esperança no coração, que quase foi para o beleléu quando viu o valor do prêmio do segurado.
- mas é bem mais que todo o dinheiro que eu já ganhei na vida multiplicado por seis!
- e tudo isso por apenas essa módica importância mensal, que o cidadão não vai nem mesmo sentir sair de seu bolso. Um verdadeiro investimento digno de alguém que se preocupa realmente com os seus familiares. Lembre-se que Tudo é possível àquele que crê!
Assim desenrolou o vendedor e ainda com o gosto do veneno na boca e a manha dos gestos, empurrou a apólice goela abaixo de sua vítima. O pedreiro a escondeu embaixo do estrado da cama. Um segredo de estado descoberto por sua segunda mulher numa faxina geral de quinta. Uma verdadeira vigarista, uma puta de beira de estrada que Jesus acolheu em seu lar. Deu casa, comida, roupa lavada e a desalmada, depois do primeiro ano, só comparecia para a procriação. Ela tinha 51 e apesar do corpo revelar algumas marcas de uma vida exausta e cruel, disfarçava muito bem com os produtos Avon e Natura que comprava em 12 vezes de uma colega de muro. Com a apólice em suas mãos, a mulher começou a ter sonhos de riquezas. Não tirava mais o valor da bolada de sua cabeça. Passou a ver seu marido apenas como um prazo de validade. Um pequeno detalhe para a sua virada total. Rapidamente imaginou um incrível plano. Acreditava que se o marido começasse a viver como nunca, rapidamente empacotaria diante do novo ritmo alucinante de vida. Ele estranhou a mudança de comportamento da patroa. Sua mulher estava mais amável. Defendia a ausência dos remédios que ele tanto detestava. E depois que ela passou a misturar as balinhas azuis no meio de sua refeição, o coroa recuperou o vigor sexual desaparecido com as preocupações excessivas da vida. Era só esbarrar na mulher que o bicho pegava geral. Mas o plano da esposa foi por água abaixo. O aposentado ficou esperto demais. Não dava mais sossego para sua companheira, que era surpreendida, também nas madrugadas, com as cutucadas nervosas do marido robusto por debaixo do lençol. A coitada não conseguia mais sonhar. Aos poucos foi se sentindo enfraquecida e por um momento percebeu que talvez empacotasse primeiro que ele se continuasse naquele ritmo. Levantou-se em uma manhã determinada a por um fim em sua tragédia. Fez um café delicioso para o marido. Torradas com manteiga, frutas, bolo de fubá e até ovos mexidos. Tudo regado com bastante estricnina. O revigorado cavalheiro não tinha mais boca para tantos sorrisos. Sentou-se à mesa, olhou bem nos olhos da mulher e arrotando tesão, disse:
- me aguarde, sua cachorra!
Em seguida, comeu tudo o que tinha direito e após terminar sua primeira xícara de café, estrebuchou para o lado com as mãos na barriga, fechando-se no chão como uma taturana indefesa. A mais nova ricaça do pedaço comprou uma rede de Postos de Gasolina, internou os menores em um colégio na Europa e foi gozar a vida com dois rapazes de 20 em uma praia do Caribe.


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