quinta-feira, 24 de setembro de 2009

TUDO NA CAÇAPA

Só lhe restou o vazio da mesa e o silêncio assustador pelo ar. Ele nunca havia perdido um campeonato. Enfiou o taco nas costas e deu meia-volta. Cabisbaixo. O foco preciso no chão. O bar. Sua única direção. Debruçou-se ao balcão. Exigiu um conhaque. Nem sentiu o gosto. Pediu outro, ainda mais transbordado. Não costumava passar da segunda, mas o orgulho encarregou-se de não parar a contagem. Ficou bebaço. Chorou baixinho para dentro do copo a noite inteira. Trocou poucos olhares. Todos mudos. Era um apaixonado sem sua amante nos braços. Estava triste e completamente derrotado. Jurou que nunca mais iria jogar. Passou o resto dos seus dias com os pés enfiados na jaca. Mudou de endereço. Escolheu as calçadas. Um ano depois, no aniversário da cidade, o prefeito resolveu realizar um novo campeonato. O Sarjeta, então, decidiu ficar limpo. Comprou roupa nova. Fez a barba. Ficou irreconhecível aos olhos do povo. Em pouco tempo, já estava cercado de novo com aquela penca de puxa-sacos desgraçados. No dia da competição, chegou de fininho. Não queria causar alardes. Fez sua inscrição e aguardou a sua vez. Dirigiu-se à mesa, ginásio lotado, ele estava agitado demais. Suava frio demais. As pernas estavam bambas, demais. Mirou a bola com a convicção necessária e sapecou a redondinha com todo o resto de esperanças que ainda tinha. Acertou quatro. De cara. Gritou sua felicidade sem nenhuma censura. Mesmo com todo o seu gabarito, sabia que o que acabava de acontecer não passava de uma tremenda sorte. Não era um principiante, mas não pegava no taco já fazia um ano. Ficou valente para a próxima tacada. Com todo o seu charme, arrochou o giz em seu taco. Mas a mão não parecia acompanhar suas emoções. Aos poucos, embebido de tanta paixão, a danada cobrava sua religiosidade. Preocupou-se com o descontrole. Não resistiu, - uma dose, faz favor! O público silenciou. Todos ficaram paralisados diante de tal solicitação. Mirou sem muita certeza nos olhos e rasgou o forro da mesa, zunindo a bola para o lado de fora do salão. Mais uma vez derrotado. Agarrou uma garrafa de conhaque e se mandou por debaixo das mesas. Sentou-se no beco, ao lado do ginásio e fixou residência por ali. Deixou tudo naquela partida. Tudo na caçapa.






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