quinta-feira, 30 de abril de 2009

CONEXÃO AMAZÔNICA


CENA I
(A cena ocorre em uma mesa de bar. Três amigos conversam sobre uma determinada mulher. O clima é pesado.)
Aércio – Tá legal, agora que vocês já vomitaram tudo, que tal deixarem essa babaquice de lado e apertarem as mãos? (pausa) Porra, meu, a gente trabalha junto faz uns oito anos, não é isso, Guilherme? (pausa) Cara, a gente se conhece desde moleque, não é mesmo PC, então? (Acende um cigarro) Puta que o pariu, vocês são foda! Discutir por causa de mulher? O pior de tudo é que a Silvinha deve tá dando pra outro nesse exato momento. E vocês aqui na confusão. Guilherme, por causa de mulher?
Guilherme – Não é por causa de qualquer mulher, Aércio. É por causa da Silvinha. Esse cara aí sabia que eu tava pegando.
PC – Sabia porra nenhuma! E a Silvinha é mulher de ficar pegando? É mulher de pegar e pronto.
Guilherme – (se levanta irritado) Aí, qual é a tua meu irmão?
Aércio – (aparta os dois) Deixa disso, Guilherme, o cara é brother, meu irmão. (para o garçon) Aí, meu chapa, trás mais três cervas, faz favor. Então, pessoal, vamos beber mais uma e tentar entender o que aconteceu?
PC – Não tem o que entender. A gata tava lá, sozinha. Aércio, tu sabe que eu sou de responsa, não sabe? Cara, eu nunca desrespeitei vocês. A gata tava lá. Eu tava ligado demais. Foi pra comemorar. Irmão, vamos inaugurar mais uma Lan, cara não é o máximo? Os negócios tão indo bem pra caralho! Eu tinha que encher a cara, entende?
Guilherme – E onde entra a porra da Silvinha nessa história?
Aércio – Calma, Guilherme, deixa o cara falar. Aí, tamo só conversando sacou? Fala, PC.
PC – Então é isso.
Guilherme - Isso o que, caralho?
PC – Porra, a gata tava lá! Foi foda, Aércio. (para o Guilherme) Ô brother, não me leve a mal, mas a gata é muito puta.
Guilherme – (derruba os copos da mesa. Parte pra cima dele. Aércio consegue apartar novamente) Safado! Me larga, Aércio! Eu vou meter a porrada nesse viado! Tá vendo? Isso é a maior traíra! Chamou a Sílvia de puta e tudo! Aí, não vai ficar assim, valeu?
(Aércio consegue novamente acalmar os ânimos. Olha para os lados com vergonha do escândalo que estão fazendo no bar).
Aércio – Meu irmão, senta aqui. Em primeiro lugar, a gata é puta mesmo, mas calma, não esquenta, sei que tu tá afim dela e te respeito por isso. Olha, tu não confia no PC? Cara ele é teu amigo, sacou? Meu, tu já bebeu um monte, deve tá confuso...
Guilherme – Confuso nada. O que aconteceu foi o seguinte, a Sílvinha veio atrás de mim. Eu tava apagado, lembra? Eu apaguei naquela noite. Esse mau caráter se aproveitou da situação e comeu a coitada.
PC – Coitada? Porra, Guilherme, menos, né? Que tu tá afim dela, eu entendo, mas chamar a vadia de coitada? E quer saber? Eu tava bebum mesmo, a gata deu mole e comi. E daí? Foi mal. Aí, Aércio, o que eu posso dizer é que só lamento. É isso. (coloca a mão em Guilherme) Cara, eu tenho o maior respeito por ti e se eu soubesse que tu tava amarradaço na gata, é lógico que eu não tinha feito aquilo. Agora vamos, a gente tem coisa mais importante pra resolver.
Aércio – Isso mesmo, PC, é assim que se fala. Então, Guilherme, já aconteceu. Deixa pra lá. Olha, quantos caras já não comeram aquela buceta, já pensou nisso? Quantas picas desconhecidas a Silvinha, com todo respeito, já não mamou? Meu irmão, pelo menos o PC é brother. É conhecido, entende? E mesmo sendo fiel tua, a gata é da casa. Isso é poético demais pra você.
(Guilherme vira o copo. Pede outra cerveja ao garçon. Acende um cigarro).
Guilherme – Olha, PC, tu é meu chapa mesmo. Gosto de você como se fosse irmão. Você também Aércio, e vocês sabem disso, não é verdade? Então, se essa parada rolar de novo, eu juro que a sociedade termina na hora. E o crédito de vocês também. É sério! Mas vamos aos negócios.
Aércio – Assim que se fala. O lance é o seguinte, o carinha da Lan do Centro não agüentou a pressão e vendeu a parada. Vamos transferir o dinheiro essa tarde. Vamos poder estender a conexão pra lá. A loja é mais espaçosa. Tem uma casa no fim do terreno. Vai dar pra fazer o cassino. O que acham?
PC – Eu acho ótimo! Sempre quis o cassino. Esse lance de prostituição é foda, meu. O cassino é mais limpeza.
Guilherme – Péra aí, ninguém me disse que iríamos parar com a prostituição. Vocês tão loucos?
Aércio – É mesmo, PC, ninguém falou isso. E além do mais, como é que vamos largar uma carteira de clientes tão valiosa? E uma coisa puxa a outra.
PC – Eu só acho que tá começando a sujar. Esses PMs são uns tarados. Tão sempre na cola. Pode falar, Guilherme, tô certo ou não tô? Esses alemão tão sempre rondando a loja. Eles querem sexo. E se nós negarmos isso à eles, aí é que fudeu. O jogo não. Com o jogo é diferente. Eles não se metem tanto. São uns duros. Uns animais que estão atrás de prazer imediato. O jogo não dá pra chegar. Não dá pra jogar sem gastar. Aí é só molhar a mão deles e continuar ganhando dinheiro. Agora, sexo, os caras ficam malucos! Circulam por dentro. Já tem menina nova por aqui. De menor, sacou? Isso pode dar a maior merda. É pedofilia! E o pior é que os coroas tão adorando essa maluquice. Sessão de sadomasoquismo e tudo. O sargento Fidélis, aquele filho da puta, já tá desconfiado. Com esse entra e sai de menininhas, vocês acham que eles pensam que isso aqui é o quê? Jardim de infância? É, porque já tem criança de 10 anos na parada. Olha, eu acho que a gente tem que apagar o cara.
Aércio – Tá maluco? Apagar PM? Tu ficou louco! Aí é que tamo na maior merda! Vamos continuar do mesmo jeito. Tá indo tudo bem. Agora é só não vacilar. O combinado foi estender a conexão, não foi?
PC – Mas eu nunca pensei que aquela idéia de bêbado fosse chegar a esse ponto. Eu só queria umas três putinha pra ganhar dinheiro fácil dos amigos e fuder na hora que eu quisesse. Essa era a minha idéia de bancar o cafetão.
Guilherme – É maninho, mas o negócio cresceu. Hoje tu tem mais de 15 putinha. E continua fudendo a hora que tu quer. Não é verdade? Fudendo até quem não devia. Só que o negócio mudou. Tomou outro rumo. E pra melhor. A idéia do cassino é genial. Tem uma pá de autoridade da cidade que é viciada em jogo. Fala aí, Aércio!
Aércio – É verdade, nós conseguimos uma lista com um chegado nosso lá na PM. Custou caro...
Guilherme – Mas valeu a pena.
Aércio – Meu, tem empresário, profissional liberal, militar graúdo e até parlamentar, sacou a parada? Muitos deles já são clientes nossos e alguns adoram as criancinhas, só vendo. Se o cassino ficar no jeito, esses puto vão encher o bolso da gente de grana. Dinheiro do povo, é, tô sabendo. Mas que se foda! (levanta o copo) Não estamos fazendo diferente desse bando de candidatos à vereador. Por que todo mundo decidiu que precisa salvar Boa Vista duma hora pra outra? É do povo para o povo, sim! (eles brindam).
PC – Demorou. Tô com vocês. Mas insisto que a parada tá sujando. Vamos ficar atentos. Não tô afim de passar o resto da minha vida atrás das grades. E eu faço qualquer coisa pra não voltar pra jaula.
Aércio – Assim é que se fala. Vamos providenciar a reforma. Dentro de cinco dias, no máximo, eu quero a casa funcionando.
Guilherme – Eu acho melhor começarmos a fazer contato com os figuraças. Vamos preparando o terreno. Esses filhos da puta vão nos enriquecer.
Aércio – É nós, mano! Nossa maré de sorte chegou. Agora é só olhar pra baixo. (eles brindam. Black-out).
CENA II
(A cena acontece no salão do cassino. Tem uma mesa de cartas ao centro. Aércio coloca mais uísque em seu copo. Está à mesa. Guilherme tá sentado em um banco, diante de uma menina caída no chão. Ela está morta. PC anda de um lado para o outro. Tá desesperado. Visivelmente alcoolizado. A cena toda é punk. Música punk).
Guilherme – (grita) Desliga essa merda!
Aércio – Fala baixo, porra!
Guilherme – Baixo é o cacete! Como é que vocês querem que eu me concentre com esse espôrro?
PC – Fudeu, cara! Fudeu! Se eu desligar vai todo mundo ouvir a nossa respiração. E agora, mano? Eu disse que ia dar merda. Eu falei que ia babar. Mas não, eu tô sempre errado...
Guilherme – Vai se fuder, cara! Isso aqui é culpa tua. Tamo assim por sua culpa!
PC – Tá vendo? Eu sabia que esse babaca ia me botar no fogo. Sedutor de menores. (parte pra cima de Guilherme. É apartado por Aércio) Vou te quebrar, seu escroto! Me larga, Aércio! Me larga que eu vou matar esse puto!
Guilherme – Vem, seu viado. Tu é um tremendo de um cagão. Reclamou tanto que não ia dar certo. É lógico que tinha que acontecer algum merda. A vadia tá morta. E a culpa é tua.
Aércio – Pega leve, Guilherme. O barco é o mesmo pros três. E vocês também são foda! Tem um presunto aqui na sala. Sacaram?
(os três olham para a menina. Pausa. A música pára).
PC – Eu falei do viadinho do Fidélis, foi aquele filho da puta do sargento Fidélis. Ele caguetou nós. Meu, eu disse que com os alemão o tratamento era diferenciado. Quem tá dentro de puteiro quer mais é fuder!
Aércio – Legal, PC, mas agora a gente é que tá bem fudido. Vamos manter a cabeça no lugar. (Dá a garrafa pra ele) Entorna, vai. Segura um pouco a onda. Tua cara tá caguetando legal.
Guilherme – Você viu a cara dela? Apanhou pra caralho. Se eu pego esse filho da puta, eu arranco as bolas dele. Pode crer. Faço ele mastigar as suas próprias bolas. (pausa) Vi isso num filme. O cara tava de cara com o estuprador de sua filha. Pegou um cabo de vassoura e enfiou no rabo dele. Depois deu um bico no cabo, sabe, pra enterrar melhor (gargalha). Judiou mesmo. É isso. Se eu encontro esse cara, eu judio mesmo!
Aércio – Acho que tu também precisa de um gole. Passa pra ele, PC. O cara tá em choque. (PC passa a garrafa. Pausa. Os três não tiram os olhos da menina).
PC – Aí, gostei do teu discurso, mas não me comoveu. Cara, você fala como se fosse diferente do viado que fez isso com a Pink. Se liga irmão, tu colocou a vadia aqui. Foi tu que prometeu um monte de abobrinha pra essa criança. Se ela tá aqui no chão, a culpa é tua. Eu não, eu sempre disse que essa porra ia melar. Mas eu sou o desequilibrado, não é? Sou o cara que cria confusão com todo mundo. Agora, foda-se! Vamos chamar logo a polícia e botar pra dentro. Que se foda! Vamos assumir logo!
Aércio – Tu ficou louco? Ela deve ter uns 16! Vai passar o resto da tua vida na cadeia. E quer saber? Com essa cara e com esse crime, vai dar o cú todos os dias. Vão fazer fila.
Guilherme – Deixa ele, Aércio, faz o seguinte, PC, deixa a gente sair e depois liga pros alemão. Coloca nós fora dessa. Aí, Aércio, vamos rapa a grana do banco. O cofre tá abarrotado também. Esse malandro não vai precisar de dinheiro mesmo. Dá pra gente ficar fora pelo menos uns dez anos, até a poeira abaixar. O que acha? Vamos pro interior. Essas minas daqui, a maioria são de lá. Ao invés delas virem pra cidade grande, vamos montar uma conexão por lá. Ninguém vai nos achar. Depois agente monta outro cassino e dessa vez, sem putinha de menor. Conexão Amazônica diversões e entretenimentos ltda. Legião Urbana, lembra, o que acha?
Aércio – (pensativo) É uma.
PC – É uma é o caralho! Vocês não vão me deixar nessa roubada não! Eu também tô nessa. E essa grana também é minha, se esqueceram?
Aércio – (tira uma pistola debaixo da roupa e a põe na mesa) Então é o seguinte, deixa de viadagem e cala a boca! Agora o que a gente precisa mesmo é resolver essa parada. Bom, fugir eu não acho que seja uma boa. Cara, o cassino tá du caralho. E tamo cheio de puta. O lance é colocar as de menor pra correr e abafar o caso. Isso aqui é uma mina de ouro.
Guilherme – Mas de que jeito? Teve testemunha.
PC – Testemunhas?
Guilherme – Isso mesmo, algumas pessoas viram a menina e além do mais, a gente não devia ter tirado o corpo lá do quarto. O povo viu a gente carregando o cadáver. Cara, se eu vejo uma cena dessas, tu acha que eu vou pensar o quê?
PC – A gente pode dizer que a vadia tava bebaça. Isso é normal por aqui.
Aércio – Tá legal. Mas a Betânia viu que ela tava morta. E ainda saiu comentando pelo salão.
Guilherme – Por isso que o povo começou a vazar.
Aércio – A safada bateu com a língua nos dentes.
PC – Vamos matar a Betânia?!
(pausa)
PC – (grita) Vão se fuder! O que vocês querem? Que um santo baixe aqui na terra e carregue o corpo dessa infeliz? A piranha tá morta! Morta! O negócio é o seguinte, vamos cortar o corpo da vadia, ela é baixinha, são poucos pedaços e depois jogamos tudo dentro do Rio pra alimentar os peixes.
Guilherme – Só porque ela é pequena você acha que são poucos pedaços? Seu escroto, ela tem os mesmos pedaços de uma mulher mais velha, adulta.
PC – Mas olha o tamanho do braço dela (segura o cadáver), você acha que a Junkie, que é o maior poste, o maior vara pau, tem os mesmos pedaços que ela? Vai se fuder! Vamos fazer o seguinte, a gente esquarteja a Junkie e a Pink. Separamos duas malas iguais e aí é só casar a grana. Quero só ver se não vai sobrar pedaços da Junkie pra guardar na mala. Tu é um merda mesmo!
Aércio – Merda são vocês dois! (aponta pra menor morta) Olha o problema aí. E vocês discutindo de que jeito vão colocar os pedaços das vadias dentro de uma mala... Caralho! Apostar? E a Junkie, o que tem a ver com isso? Ela não tava nem aqui.
PC – Foda-se! Acabou de entrar na história. Quero resolver a parada com esse mané. Péra lá, tudo que eu digo ele desdiz?
Guilherme – Isso mesmo, agora a viciada vai morrer. Vou enfiar ela todinha dentro da mala, tu vai ver...
Aércio – Então porque não colocamos a Betânia? Ela é grandona também. E foi ela que deu todo o serviço.
(pausa).
PC – Beleza. Eu topo. A Betânia serve.
Guilherme – É mesmo. Vamos retalhar essa piranha. Ninguém tá comendo ela mesmo. Isso aqui não é negócio pra ficar dando prejuízo. Não tem essa de - não ganhei hoje. A gente sempre ganha.
Aércio – Tá legal. Agora vamos nos livrar desse corpo. Trás a mala PC. Depois a gente dá um fim na Betânia. Guilherme, pega o terçado. Eu vou estender um plástico no chão. Não pode ficar nenhum vestígio dessa vadia por aqui. Nós nunca a vimos. Entenderam? E a partir de hoje não entra mais de menor nessa casa. Certo?
(Cada um vai para um lado. Black-out. Pausa. A campainha toca. Guilherme vai atender. É uma menina linda. Tem uma mochila nas costas).
Estrela – Oi.
Guilherme – (dá uma comida com o olhar) Oi. Quer falar com quem?
Estrela – É que me falaram que aqui... que aqui vocês recebem algumas meninas pra dar um tempo...
Guilherme – Sei.
Estrela – Olha, eu cheguei ontem do interior e...não dormi nadinha ainda...tô precisando de um banho. Qual é o esquema? Deixa eu ficar, vai? É só por uns tempos, só até eu entrar pra faculdade.
Guilherme – Qual tua idade, princesa?
Estrela – 17.
(Guilherme acena com a cabeça. Ela entra. Ele sai, tira um terçado da cintura e dá uma olhada na rua. Apenas uma conferida. Volta pra casa. Black out.).

FIM










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