sábado, 2 de outubro de 2010

NOITE INFERNAL NO CHAMPION MOTEL

A festa no Champion Motel entrou para a história. Todos os viciados do cabeça e muitos outros das redondezas estiveram por lá. Pelo menos é o que reza a lenda. Após a reunião de condomínio, no outro dia mesmo, a moçada invadiu o Morro do Adeus com mochilas lotadas de toca-fitas. Todos os moradores do 4º andar, os lesados no roubo, sentiram na pele o gosto do veneno maldito. A bagaça estava armada. Renatinho, surfista de trem alucinado, que carregava no currículo três reprovações na sétima série, garoto de 17 anos, e que era presença marcante nas rodas dos adultos, ele é quem comandava o negócio. Dizem que ninguém ficou de fora. Cabinha levou as amigas. A maioria menor de idade. O cardápio alcoólico era para todos os gostos, de garrafas de batida de mel, cerveja barata e muitos Jack Daniels. Afinal de contas, estavam todos montados na grana. E não faltou dinheiro para meio quilo de maconha, 350 gramas de cocaína, da nervosa e dez cartelas de Optalidon. Foi uma quinta-feira maldita. A turma chegou aos poucos ao Motel. Uns de carro. Roubados dos pais. Outros com motos, que só faltavam berrar igual um cabrito. Tudo na ilegalidade. Algumas meninas entraram no Motel dentro do porta-malas do carro Chevette do Renatinho. As menores. A turma reservou a suíte presidencial, que tinha até pista de dança. Já deu para ver o derrame que foi aquela noite. Quem ía chegando, já recebia um copo duplo de mel e já era convidado a abrir a boca e mandar para dentro um comprimido. Assim estava a entrada da Suíte do Horror. Lá dentro, alguns garotos ficaram responsáveis de enfeitar o lugar. E para todos os lados era possível encontrarmos garrafas e copos à disposição do freguês. Em todos os cantos bandejas lotadas de pó. Na beira da piscina, mas protegidos da água, muitos baseados apertados esperando suas vítimas. As cartelas de comprimidos ficaram no banheiro para a hora do derrame geral. A dose seguinte após o vômito restaurador. E muita camisinha... Ninguém ali estava para brincadeira. Só monstros. Depois de muita esbórnia, do troca-troca inevitável, dos corpos cansados de tanto trepar, dos gritos sem qualquer repressão, o interfone da suíte tocou. Mas diante daquele cenário, com Jesus e seus Apóstolos barrados bem na entrada, não preciso nem dizer que ninguém ouviu. A turma curtia tanto, que até alguns hóspedes vizinhos resolveram juntar-se à eles. Pelo menos os mais insanos. E o interfone insistiu. O funcionário padrão, cansado de suas inúteis tentativas resolveu partir para o quarto. Outros clientes, mais interessados na trepada de seus quartos, reclamavam sem parar. Era um barulho infernal, pareciam completamente fora de si, bem longe de seus valores sociais controladores. Hércules, funcionário exemplar do Champion Motel, e que nas horas vagas vendia quentinha no bairro para pagar o restante de suas contas mensais e que na hora do sufoco ainda mamava umas pirocas na Praça XV, em troca de uma nota de dez pratas, deixou sua Revista Sexy de lado e dirigiu-se ao antro demoníaco. Ele era um cara forte, com medidas de sobra, carne ali é que não faltava. Tarado de nascença, recordista das onze punhetas diárias. É verdade, Hércules tocava onze por dia. Orgulhava-se disso e fazia propaganda pelo bairro. Era morador do Núcleo da Bomba, mas a moçada do bairro não levava muita fé no indivíduo. Razão pela qual ele resolveu acabar com a farra na suíte presidencial. Ficou puto por não ter sido convidado. Chegou à porta e tocou a campainha. Nada. Bateu na porta. E nada. Então, revoltado e cheio de complexo de exclusão, meteu o pé na entrada de madeira. Só assim foi ouvido. E por todo o Motel. Cabinha abriu a porta assustada. Foi a única que se importou com a pancada. Ela estava apenas com uma calcinha fio-dental. O porteiro gaguejou. Não esperava aquela recepção maravilhosa. Cabinha, com os dentes trincados de tanto meter a napa e os olhos arregalados, maiores do que o do Lobo Mau da Vovozinha, com os peitões na cara dele, falou qualquer coisa incompreensível. O porteiro mirou nos peitões, tentou, em vão, iniciar uma comunicação com a menina nervosa e em seguida foi puxado para dentro da suíte, sem nem saber de onde veio o puxão. Quando se deu por conta, estava no meio da cama. Era a atração principal. O prato da noite. Um monte de pequenas peladas ao seu redor, algumas já beijavam os seus pés. Os rapazes, de longe, na espreita. Ele fechou os olhos, feliz, e iniciou uma oração de agradecimento à Papai do Céu. No meio da reza, dividido entre a fé e seus pensamentos nada religiosos e no meio daquele ambiente Calígula demais, sentiu uma porrada afiada na perna direita. Abriu os olhos desesperado, com uma dor invocada e viu a sua perna distante do corpo. O lençol pintado com um vermelho bem forte. Sua perna espirrava sangue para todos os lados, respingava em todos que estavam próximos e isso os deixava cada vez mais excitados. E todo mundo em volta gritava e de tempos em tempos foram aparecendo facões nas mãos de cada um, ele tentou levantar, e sem chance, perdeu o pescoço em uma só estocada. Não teve um que não provou do porteiro. Quando o sol anunciou a sua chegada, as Bestas fugiram aflitas daquela luz mortal. Cada uma para um canto, em busca da salvação, e todas completamente saciadas após aquela noite infernal no Champion Motel.

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