segunda-feira, 16 de junho de 2008

HOMENAGEM AO SURFISTA CALHORDA

Estacionou seu pequeno fusquinha amassado num pequeno espaço entre duas caminhonetes. Saiu pelo teto solar. Olhou para o mar e avistou altas ondas. Poucos surfistas na água. A areia lotada de gente. Todos com muito medo da ressaca de Janeiro. Minúsculos homens desmaiados arremessados de volta à areia. O mar competia por si. Desamarrou sua prancha rachada e se mandou do calçadão. A cada passo que andava, ouvia o povo comentar.
- olha, lá, é o madeira!
- é mesmo, irmão, acho que o minhoca do madeira vai cair!
- ele disse que era a despedida de sua madeira rachada!
E assim foi, até que ele chegasse na beira da água. Repousou a prancha, que já tinha idade, muitos campeonatos vencidos e muitos mares alucinantes nas costas. Sentou-se. E foi se alongar. O mar estava gigante. Até para molhar os pés era arriscado. Nenhum homem havia conseguido entrar, pegar uma onda e voltar para praia. Eles nem conseguiam chegar na arrebentação, o que dirá descer em alguma nervosa daquela. Ele levantou-se. Em sua volta o tumulto já se formava. Olhou para o mar. Olhou para as pedras. Agarrou sua prancha e foi caminhar até elas. Ninguém entendeu. Pensavam que ele estava fugindo. Ele subiu sem pressa alguma. Acariciando-as. Chegou ao topo da maior e se atirou lá de cima. Um mergulho em pé. Lado a lado com sua guerreira. Se espatifaram na água. O mar agitado. Não dava para ter muita orientação, e ele precisava se afastar da parede de pedras ao seu redor e torcer para que nenhuma onda o arremessasse contra elas. Pulou em cima de sua prancha e remou desgastantementedesgastantementedesgastantementedesgastantemente até parar. Já estava no pico da sequência e sabia que com a próxima viriam mais nove à seguir. Não podia perder a chance. O vergalhão se aproximou. Ele remou até o cúme. Despencou lá de cima. Um vertical sem direito a oxigênio e com muita chuveirada na cara. Até clarear e o equilíbrio conduzir um pouquinho. Velocidade. Adrenalina. Paraíso na água. Entubou. Na areia o povo se deseperava com o sumiço do madeira. Levou um tempo desaparecido até ser regorgitado pelo mar, com muita classe. Cut back daqui, Aéreo dali, e assim chegou ao final. Saiu do mar em silêncio. Cavou um buraco e enterrou sua prancha. Falou em um idioma nativo qualquer e saiu com seu fusquinha arrastado a dois carros. Não tinha forças para chegar em casa sozinho.






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