terça-feira, 3 de junho de 2008

TEM GENTE QUE NÃO GOSTA DE MULHER MAIS VELHA.

Olhou a multidão do outro lado da rua. Intimidou-se. Deu um gole na latinha. Apanhou um cigarro dentro do maço guardado em um bolso. Pensou em abortar o plano. O de atravessar para o outro lado da calçada. As pessoas iam e vinham de todas as direções. Ele estancado. A multidão o apavorava muito. Foi esbarrado duas vezes. Na primeira, três homens voltando do futebol quase o jogaram do meio fio pra rua. Ele xingou os caras de tudo quanto era nome. O mais levinho olhou pra trás e resolveu encarar. Um puta folgado. Sabia que os outros iriam ajudá-lo. Aplicou logo uma no queixo. Ele caiu. Os outros dois ficaram só olhando. Resolveu levantar. Encarou o levinho, que em seguida olhou para os seus colegas, todo sorridente, pois já havia acertado uma em cheio nele. Nem se mexeram. Fizeram cara Apocalypto. Então ele partiu pra cima do malandro. Meteu uma pezada no peito dele, que capotou em seguida. Lógico. Deu uma cabeçada que espatifou a caixola. Sangue pra todo lado. Não teve jeito. Desmaiou. Os outros dois indivíduos se olharam. Deram as costas pra uma possível confusão. Deveriam ter algo melhor em mente. E o amigo era totalmente dispensável. Na segunda, uma idosa. Dessas de bengala e tudo. Ele tropeçou em um desnível na calçada e esbarrou na velhinha. Prontamente se desculpou. Foi apenas um desequilíbrio na coitadinha. Nada mais. Idosa. Cabelos brancos igual a cérebro humano. Deu um grito que mataria de inveja qualquer Edson Cordeiro de esquina. Imediatamente a multidão congelou. Como se naquele exato momento, aquele estridente grito fosse capaz de impedir qualquer forma de manifestação lógica entre as pessoas. Ele ficou com os olhos arregalados. Saltados. Descolados. Desenraizados. E pensou em fugir. E pensou em pedir novamente desculpas a pobre idosa. E pensou em chutar a cabeça da idosa. E pensou em dar uma banda na velhinha. E pensou em encaçapar uma mãozada de cima pra baixo na cabeça da bruaca. E pensou em mijar na cara da desgraçada daquela já morreu e nem sabe. Mas não fez nada. A multidão continuou o seu caminho. Indecifrável. Com sua organização desgovernada. Ele colocou a mão no bolso esquerdo. Tirou um maço de cigarros todo rasgado. Só tinha aquilo no momento. Esperou que a velhinha lhe enfiasse a bengala goela abaixo. Tirasse de dentro de sua sacola uma pistola qualquer. Mas a velha, depois de uma encarada suave no maço dele, abriu um sorriso de canto. Estendeu a mão e pegou o maço. Arrancou três, dos cinco que lá estavam. Deu uma risadinha. Saiu andando. Acendeu um dos cigarros e desapareceu na fumaça.




Nenhum comentário: